Às vezes acontece desse jeito mesmo. Alguma coisa quer brotar na garganta, faz força para romper as duras e grossas paredes da angústia de não saber como expressar um sentimento inominável e, por isso mesmo abominável, difícil de encarar e ainda mais de entender. Mas eis que revirando as gavetas, ou em tempos modernos, as pastas de mensagens enviadas de longa data, surgem então as palavras escritas por uma daquelas amigas que, como outros, ainda que próximos, não nos alcançamos em meio aos arranha-céus de nosso entorno. Tão inabaláveis quanto estas estruturas é nossa ligação; e tão forte é esta última que nossos sentimentos se parecem, se encontram e se apóiam.
Eu entendo o quer dizer porque vivencio o seu sentimento. Esse susto que nos cala, esse caminho enigmático que desemboca na incerteza, mas que deve ir em frente ainda que assim não pareça seguir, porque ir adiante pode nos levar a um retrocesso, e sem volta; os atalhos podem se tornar tão longos e árduos quanto os pântanos tenebrosos que nos atravessam.
E, sendo assim, não há mais nada a dizer. Recolho-me e, como será dito, ensimesmada me mantenho até que eu possa entender o que se passa. Faço minhas as suas palavras:
“Eu queria que não revirasse, queria que não doesse. Mas doe, mas revira. Ela é gigante e eu pareço cada vez menor. Só uma boca, só um ouvido, só um ruído abafado. Desses que a gente solta meio sem querer, meio sem saber porque...só suspira e segue. Tantas vezes sem saber pra onde, só consigo saber que meu corpo está aqui - nesta cidade que me deixa ficar e que me deixa sem graça e me pergunta se rindo: "o gato comeu sua língua?". E eu sou a que não fala... a que enrubesce e não sabe o que fazer com as mãos. Mesmo assim tenho insistido. Talvez ela (tão grande!) se acostume com meu jeito de querer ficar quietinha até descobrir o que estou procurando, talvez eu me acostume com seu jeito de zombar de mim só pra me deixar irritada, só pra me fazer perder a paciência e revelar qualquer coisa de malcriada, de instantâneo, de descontente. Às vezes eu penso que ela simpatiza com pessoas assim... estouvadas. E vou seguindo assim-ensimesmada!-´procurando olhos e ouvidos imaginários que me amparam, acompanham, que me testemunham. Lembro de mim assim, de um jeito de querer ser invisível, talvez de uns quinze ou tanto mais anos atrás. Me vejo no re-início deste caminho de ficar livre de mim, livre dentro de mim. Até que eu possa olhar direto nos olhos dela e começar a falar.” De: A. Carrascoza
Nenhum comentário:
Postar um comentário