quinta-feira, 22 de abril de 2004

No embalo deste rítmo louco e alucinante em que está minha vida, tenho tido muito aquele sentimento de que "ignorância é felicidade".
Lembro-me bem de quando não tinha muitas razões para pensar nos acontecimentos da minha vida como sendo nada mais do que consequência da minha falta de experiência, da minha burrice ou da minha incompetência. Tudo se explicava porque eu era feia, gorda e não sabia conversar.
Pois é, bons tempos esses, quando nada do que dizia respeito à psicanálise poderia explicar o meu triste lugar no mundo.
Mas agora já era, tô com isso, esses conceitos e paradigmas para sempre encrustados na minha cabeça, como as cracas que ficam coladas ao redor dos olhos da baleia.

E assim como a baleia não tem mãos para simplesmente arrancar aquilo da cara dela, eu também não posso simplesmente esquecer tudo o que apre(e)ndi depois de uma faculdade de Psicologia.
Um exemplo de como isso "contamina" o nosso olhar sobre as coisas foi numa exposição que visitamos lá em Porto Alegre. Tinha uma instalação entitulada "A grande cuia" que era basicamente um monte de cuias grudadas pela boca que tomavam a forma de uma estrela de várias pontas. Para pessoas "normais" aquilo era o que era, mas depois, discutindo com dois amigos "psis", um deles comenta: "O que era aquele monte de chupeta grudada, parecia um bico de peito... Eu falei: "Não, eram cuias (só porque eu tinha lido o nome da instalação é que consegui deduzir, porque tinha tido a mesma primeira impressão). Daí ele falou: Puta... já tava vendo um monte de peito, "seio bom, seio mal, vixe"... E foi então que concluímos que já era, não tinha mais jeito, estávamos fadados a olhar para o mundo daquele prisma, com aquela lente que quer enxergar o que há por detrás e tal.
Bem, e como também não tem um botãozinho para acionar ou não essa lente, às vezes fico vendo mais do que gostaria em algumas situações. É claro, as que dizem respeito à mim, ao meu jeito louco e alucinado de lidar com os tais acontecimentos que envolvem minha existência. Tudo dá pano para manga, associações grotescas, mas que estranhamente fazem o maior sentido para tudo o que anda acontecendo. O foda mesmo é saber que saber de tudo isso não é garantia de que algo mude, a não ser que você assuma sua responsa, coloque o corpinho na jogada, se implique, e faça as coisas realmente acontecerem por você.
É uma grande lição, eu acho, mas poderia ser um pouquinho mais fácil, né!, tipo uma pílula sem efeitos colaterais e com gosto de morango que fizessse tudo ter sentido dentro de uma hora depois de tomada... Quem nos dera, né, Freud...

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