segunda-feira, 12 de julho de 2004

Como é triste presenciar a mediocridade de certos profissionais que fazem, mais do que qualquer outra coisa, parte da massa incluída no mercado de trabalho.
Há algum tempo, em mais uma tentativa de entrar no esquema de troca de força de trabalho por capital, cuja escassez anda prejudicando tremendamente meu acesso aos bens de consumo culturais, ou seja, baladas, tive, vamos dizer, a oportunidade de presenciar o exemplo da capacidade ilimitada do ser humano de ser patético.
Depois de garimpar oportunidades nas páginas dos classificados de emprego, fui entregar meu currículo numa das empresas que ofereciam vagas. Depois de uma entrevista inicial com uma garota simpática e que falava mais rápido e jogado do que qualquer narrador de corrida de cavalos, cujo objetivo era convencer os candidatos da mina de ouro que era trabalhar naquele grupo, claro, depois de ceder um mês de trabalho voluntário, me dirigi a uma sala onde outros 20 e poucos desafortunados aguardavam a chegada do "gerente" que iria fazer a seleção do pessoal. Assim que coloquei a cara na porta, notei certa apreensão daqueles que já estavam ali presentes, e por que não dizer, certa aversão da minha pessoa, afinal eu era mais uma que iria competir pela sagrada vaga.
Ignorando a sensação de morte iminente pela qual fui tomada frente a tantos olhares faiscantes, me sentei na primeira cadeira perto da porta, mais pela proximidade do que para pagar uma de boa aluna. Estava eu preenchendo uma ficha que só faltava perguntar quais os meus planos após a aposentadoria quando ouvi me chamarem: "Frida, o que você está fazendo aqui?". Era uma amiga da faculdade que também tentava sua inserção no mercado. Ficamos ali trocando nossas experiências de recém-formadas desamparadas quando, de repente, adentra a sala um ser totalmente espalhafatoso que viria anunciar que o tal "gerente" havia chegado.
Como eu não tenho as orelhas nas costas, não me senti na obrigação de me virar para presenciar o anúncio de tal acontecimento, e continuamos conversando, deixando claro que falávamos num tom que mostrava que o assunto dizia respeito tão somente a nós duas e que ninguém tinha obrigação de ouvir nossas histórias.
Pensando bem agora, acredito que tenha sido o fato de eu não ter me virado e dado a devida atenção àquela entrada triunfal, pelo menos na cabeça daquela pessoa, o motivo da situação ter tomado proporções tão inimagináveis. Mas a alegação foi a seguinte: "Vamos ficar quietos e manter o silêncio, aí!". Notem: o tom usado foi o mesmo de um "cala a boca" bem mal educado. Naquele momento não me ocorreu nada senão virar para minha amiga e lhe dizer no mesmo tom em que conversávamos: "Ela está louca?". O que o ser disse depois disso foi tão improvável quanto sua primeira intervenção: "Vamos virar para a frente e ficar quieto. Tem que fazer igual primário agora!".
Meus caros, o que pode levar um ser humano dessa idade e naquela posição a soltar tão deliberadamente uma asneira dessa magnitude senão um desejo imenso de querer dar uma de superior? Afinal ela devia ser a sub-ajudante-assistente do co-coordenador da recepção!
E se vocês imaginam que tais barbaridades tenham sido um ato isolado de uma mente insana, saibam que o movimento que notei nos momentos seguintes provou que o espírito corporativista havia sido muito bem desenvolvido naquela instituição.
Acontece que cada uma das pessoas que trabalhavam naquele antro começaram, uma a uma, a entrar na sala tão somente para fazer uma pergunta: "Quem é Frida?". E com a mesma estranheza de quem acorda sem saber onde está, me vi em meio a uma grande cena cuja moral foi deixada bem clara pelo "gerente". Mas antes de anunciá-la, vamos à ele, o "gerente".
Com seu terno e sua gravata, ele entrou na sala com seu ar seguro. Somente tanta altivez poderia disfarçar os grotescos erros de português, do tipo "...na atualidade dos tempos de hoje", ou as generalizações infantis como "... pais que criam para o bem, o filho será bom; criados para o mau, será mau". Discurso facilmente comprado pelos menos avisados e pelos mais desesperados que balançavam positivamente suas cabeças.
O "gerente" avisou que ali a gravata e o tayer eram fundamentais, sem eles seria impossível começar a trabalhar. Se bem que ele não explicou porque, talvez por ele ser a prova viva de que a aparência engana, sim. E o "gerente" advertiu que ali estavam à procura de um perfil determinado, o de uma pessoa suficientemente inexperiente que pudesse ser facilmente "treinada". Sabemos bem o que ele quis dizer com isso, seus inúmeros exemplos deixaram todas as cartas abertas na mesa, e é aí que encontramos a moral da História.
Fico aliviada em saber que não me encaixo no perfil necessário para fazer parte daquela organização, não fui aceita, não me encaixava. Ainda bem.

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